O Brasil está incluído no grupo de países próximos de atingir algumas das metas de Educação para Todos, mas ainda enfrenta problemas para cumprir outras, em especial a da qualidade, conclui o Relatório Mundial de Monitoramento sobre Educação para Todos lançado nesta segunda-feira (08/11), às 15h, em Brasília. O relatório, que monitora o progresso rumo às seis metas* da Educação para Todos, definidas por mais de 160 países no Fórum Mundial de Educação em Dakar (2000), constata que esforços significativos estão sendo empreendidos para aumentar recursos, ampliar o acesso à escola e promover a paridade de gênero no mundo, mas que a qualidade de sistemas de educação está prejudicando crianças e poderá impedir muitos países de alcançarem a Educação para Todos até 2015. Os dados são referentes aos anos de 2001 e 2002.
A importância da qualidade está refletida no Índice de Desenvolvimento do EFA (IDE), que mede o progresso geral de 127 países rumo à Educação para Todos. O índice é baseado em indicadores para as quatro metas de Dakar mensuráveis: educação primária universal, alfabetização entre adultos, qualidade da educação (usando a taxa de permanência de alunos até a 5ª série como indicador) e paridade de gênero. O Brasil fica na 72ª posição entre os 127 países analisados. O país aparece em 32º em educação primária universal, 67º em alfabetização entre adultos e 66º no quesito paridade de gênero. Na taxa de permanência de alunos até a 5ª série, o Brasil fica em 87º lugar.
O relatório apresenta estudos de caso de 11 países (Bangladesh, Brasil, Canadá, Chile, Egito, Finlândia, República da Coréia, Senegal, África do Sul e Sri Lanka) que mostram como países ricos e em desenvolvimento estão enfrentando a questão da qualidade. O Brasil, ao lado do Chile, é citado como exemplo na América Latina no enfrentamento da questão da qualidade. O documento elogia, entre outras iniciativas, o programa Bolsa Escola, as políticas brasileiras para o enfrentamento das desigualdades regionais e sociais, por meio do FUNDEF (Fundo de Manutenção e de Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério), o treinamento de professores através de ensino à distância e o aumento do número de livros didáticos no país.
De acordo com o IDE, 41 países estão relativamente próximos de atingir as metas. Entre eles estão principalmente países industrializados e em transição, mas também países na região da América Latina e Caribe como Argentina (23º), Cuba (30º) e Chile (38º), junto com cinco pequenos Estados insulares.
A eles se seguem outros 51 países, entre eles o Brasil, encabeçados por Romênia, Bulgária e Costa Rica e vários outros países árabes e latino-americanos, que estão próximos de atingir algumas das metas, mas são freados pelo lento progresso em outras, em especial a da qualidade.
Por fim, um terceiro grupo de 35 países, 22 deles na África Subsaariana, mas também incluindo os países populosos Bangladesh, Índia e Paquistão, estão muito distantes de atingir as metas, com desafios múltiplos a enfrentar simultaneamente para que a EFA seja garantida.
O documento propõe uma série de políticas para melhorar a qualidade da educação, enfatizando que apesar de não haver receitas universais, uma visão robusta de longo prazo para a educação, forte liderança do governo e um corpo docente motivado que conte com apoio são condições para o sucesso de reformas qualitativas.
A comunidade internacional, segundo o relatório, tem um papel crucial a desempenhar no apoio a esse processo. Atualmente, a ajuda internacional à educação básica está estimada em torno de US$ 1,5 bilhão por ano. Recentes compromissos poderão aumentar esse volume em mais US$ 2 bilhões por ano ao longo dos próximos anos, mas esta cifra ainda está aquém dos estimados US$ 5,6 bilhões por ano necessários para alcançar a educação primária universal até 2015.
“Turmas superlotadas, professores mal qualificados e escolas mal equipadas com parcos materiais de aprendizado continuam situações muito familiares em vários países”, afirmou o Diretor Geral da UNESCO Koïchiro Matsuura. Entretanto, alcançar a educação para todos depende fundamentalmente de garantir uma qualidade decente: o que as crianças aprendem e como elas aprendem pode determinar o sucesso ou fracasso de sua experiência escolar e de oportunidades subseqüentes na vida, completou.
Enquanto isso, em um terço dos países com dados disponíveis menos de 75% dos alunos chegam à 5ª série. Avaliações nacionais e internacionais também mostram que níveis de desempenho são muito fracos em países de renda baixa e média e entre grupos desfavorecidos em alguns países industrializados.
O relatório oferece uma análise detalhada dos fatores-chave que influenciam a qualidade da educação, incluindo recursos financeiros e materiais para escolas, o número de professores e seu treinamento, matérias principais, pedagogia, linguagem, a quantidade de tempo efetivo de aprendizado, infra-estrutura e liderança.
Existe uma clara tendência positiva em várias dessas frentes. Investimentos em educação, por exemplo, aumentaram na última década em vários países em desenvolvimento, e o acesso à educação continua melhorando. Mas ainda há 103.5 milhões de crianças fora da escola, um número que está caindo lentamente demais para se alcançar a educação primária universal até 2015. O relatório também enfatiza que a ampliação do acesso não foi acompanhada pela expansão de recursos e infra-estrutura educacionais.
A situação é mais perceptível, por exemplo, no caso dos professores, tidos pelo relatório como a maior influência no aprendizado. Em muitos países de baixa renda, professores não satisfazem sequer os requisitos mínimos para a profissão. No Togo, por exemplo, apenas 2% dos professores satisfazem o requisito mínimo nacional que é ter educação secundária parcial. Em Botswana, onde o requisito é a educação secundária completa para se poder ensinar em escolas primárias, apenas 10% dos professores alcançaram a série necessária. De forma semelhante, um estudo recente de sete países do sul da África, citado pelo relatório, constatou que alguns professores primários de matemática possuíam apenas conhecimento básico do assunto e de fato obtinham notas piores que as dos seus alunos nas mesmas provas.
Freqüentemente, esses professores mal treinados enfrentam salas de aula superlotadas. O relatório constata que nos países com a maior razão aluno/professor, um terço dos alunos que ingressam no primário mal chegam á 5ª série. Em muitos países da África Subsaariana e Sul e Oeste Asiático, onde a educação se expandiu rapidamente ao longo da última década, a razão aluno/professor tem de fato aumentado. Na maioria dos países dessas regiões, o número de alunos por professor excede 40 na educação primária e passa de 60 em vários casos, incluindo Malawi, Moçambique, República Centro-africana e Chade. Ademais, em muitos países de baixa renda, os salários reais dos professores têm diminuído em relação à renda média e seus rendimentos são muito baixos para permitir um padrão de vida aceitável.
A pandemia Hiv/Aids é outro fator que solapa gravemente a qualidade da educação, afirma o relatório. Na Zâmbia, por exemplo, é estimado que 815 professores primários tenham morrido em decorrência de Aids em 2001. Correspondendo a 45% dos professores treinados naquele ano. Ao largo da África Subsaariana, mais de 11 milhões de crianças menores de 15 anos perderam pelo menos um dos pais para o Hiv/Aids. O relatório ressalta que suas oportunidades de aprender são freqüentemente tolhidas pela necessidade de cuidar de parentes doentes ou contribuir para a renda familiar.
O Relatório Mundial de Monitoramento sobre Educação para Todos é elaborado por uma equipe independente na sede da UNESCO em Paris (França). O trabalho do grupo dá seguimento ao Fórum Mundial da Educação ocorrido em Dakar, Senegal, em abril de 2000, e se beneficia de consultas a um corpo editorial internacional. É financiado pela UNESCO e algumas agências bilaterais. Suas constatações servirão de base para as discussões do Quarto Encontro do Grupo de Alto Nível em Educação para Todos (em Brasília, 8 a 10 de novembro). Este grupo pequeno e flexível que inclui líderes de alto nível de governos e da sociedade civil em países desenvolvidos e em desenvolvimento, além de agências da ONU e outras organizações internacionais, serve para alvancar o comprometimento político e a mobilização de recursos técnicos e financeiros em prol da EFA. Informado pelo Relatório Mundial de Monitoramento, ele também oferece uma oportunidade de cobrar os compromissos assumidos pela comunidade internacional no Fórum de Dakar.
Fonte: Assessoria de Comunicação da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Cultura e a Ciência (www.unesco.org.br)